Anjinha


Madrugada em São Paulo. Em uma vazia e escura rua do Centro, uma confusa moça caminha a passos rápidos. Não consegue sequer andar em linha reta.
"Confusa" é pouco! Neste momento, ela nem sabe quem é!
Sabe apenas que tem fome. Muita fome!
A um quarteirão, passa outra pessoa, outra moça. Vem também a passos largos. Coque no cabelo, ela deve estar indo ou voltando do trabalho, ou de casa.
Pouco importa.
A primeira moça pára de andar, ao perceber a outra. Estende um braço em sua direção.
A moça de coque pára, também. Não sabe por quê.
Também não importa.
Uma delas, com os olhos arregalados, de tão excitada que está, comanda:
- Venha até aqui! AGORA!
Indiferente a tudo (ou haveria pânico em seu rosto?), a outra começa a andar em direção à ordem. Devagar demais!
A moça faminta se desloca incrivelmente rápido em direção à sua vítima, atracando-se ferozmente em seu pescoço! Enfia os pontiagudos caninos como se animal fosse e começa a sugar violentamente o delicioso sangue! Num ímpeto, rasga a camisa da sua dominada e começa a lhe apertar o seio esquerdo!
Dor e prazer para ambas!
As duas gozam. Uma, pouco antes de ficar sem todo o sangue e morrer.
A outra já tinha morrido antes de tudo isso começar.
A morta-viva deixa a outra morta ir ao chão. Nunca se sentira tão forte, tão poderosa! E quer sentir isso de novo!
Novamente arregalando os olhos e os instintos, ela começa a examinar os arredores! O sangue escorrendo da boca não é sinal de saciedade! Ela está desesperada por mais! Há pouco a diferenciá-la de um animal, agora!
Andando em círculos, no meio da rua, ela ainda não se lembra de quem era e nem sabe quem é!
Até que...
- Anjinha!
Um susto! Ela se volta na direção da voz! Seu ímpeto é atacar!
Mas ela vê alguém conhecido, e é uma visão boa...
- Anjinha, sou eu, lembra?
De certa forma, sim. Mais do que isso, ela sente. Seu frenesi começa a se esvair. Seus músculos se relaxam ao ponto de ela cair de joelhos, olhando fixamente para o dono da voz.
Este, vagarosamente, se aproxima, se abaixa em frente a ela, lhe toca a face...
- Ei, garota, lembra de mim?
Ela abre a boca, mas não diz nada... Ele prossegue:
- Você é minha Anjinha, lembra?...
O toque e a voz fazem com ela feche os olhos. Ela se lembra, sim, de ambos. Ela se lembra da primeira vez em que ele a chamou de “Anjinha”...
Ela se lembra...


- Vocês tem certeza de que eu estou bem?
Num carro preto que ia rapidamente cruzando a Avenida Paulista, a paciência ia se esgotando!
- Bianca, você está ótima... – disse a motorista, pela enésima vez.
- Sim, não se preocupe, a roupa está ótima, você não vai ficar deslocada, fica fria... – disse a ocupante do outro assento frontal. Pelo mesmo número de vezes...
- Ah, mas é que... ai, sei lá, eu tô tão ansiosa!!
A motorista conseguiu sorrir. Era também a enésima vez que Bianca dizia isso...
- Ah, relaxa, Bi! A primeira vez, é assim mesmo!
- Eu sei, Bárbara, mas... ai, sei lá!... Todo mundo de preto...
- Assim como você!
- Sim, Dri, mas eu não sei se eu estou adequada!
- Ai, CDF querendo sair prá balada é foda!! – riu-se Bárbara – Não precisa se preocupar, a gente vai estar junto com você!
- Ainda bem!... Ah, gente, é a minha primeira vez!... Mas, assim,... Vai ter gente de vampiro, mesmo?
- Sim, claro! – disse Adriana – Mas não se preocupe, que não vão te morder!
- E, se morderem, não vão sugar!
- Ceeeeerto!...
As duas da frente riram. É, CDF querendo sair de balada é foda!...
Mas o figurino de Bianca até que estava adequado: vestidinho preto até o joelho, ombros de fora, um par de botas pretas, dois brincos de lua crescente e um anel com uma enorme “pedra” roxa oval. Pintara as unhas de preto, mesma cor do batom, da sombra e que lhe era natural nos cabelos e olhos. Tudo contrastava maravilhosamente com a pele branquinha e o jeitinho doce!
(Adequado ou não?)
De qualquer forma, cerca de vinte minutos mais tarde, já estavam no que o pai de Bárbara chamara de “essa tal festa gótica a que vocês sempre vão”! Bianca tremeu o tanto quando pôde, ao passar a porta! Teve que fazer um graaaaande esforço prá não dar meia-volta e ir prá casa! Mas, depois de uns dez minutos, já estava mais fascinada do que qualquer outra coisa! Todo mundo de preto, muitos de maquiagem beeem pesada (incluindo alguns homens). E ela viu uns “vampiros” bem interessantes, por lá! Mas nenhum deles lhe interessou muito, na verdade...
Não logo no início!
- E aí, Bi, está gostando da noite? – perguntou Bárbara.
- Ai, tá muito legal! As músicas tão ótimas! E o pessoal parece bacana, também! Quer dizer, tem uns que dão medo, né?
- Ah, normal! Você se acostuma! Agora, e os gatos, hein?
- Ah... – Bianca ruborizou.
- Tô ligada! Relaxa e deixa fluir!
- É, eu até vi uns interessantes, mas nada de muito... Nada que me fizesse...
- Sei, sei!... Então, vou te dizer uma coisa!
- O quê?
- Liga o radar!!
- Que radar?
- Aquele que, pelo jeito, você esqueceu em casa!
- AH??
- Ai, caramba, Bianca, você não se toca?? Pô, tem um gatão de olho em você há mais de uma hora!!
- Onde?!!?? Em mim?!? Sério?!? Ai, meu Deus!! Quem é?!?!?
Bárbara demorou um pouco para dar essa informação! Mas porque não conseguia parar de rir!
- Ai, Bá, para com isso! Eu já tô nervosa!! Quem é?!?
- Ai, Bi, só você, mesmo! A gente vai ter que te dar umas aulas!...
- QUEM É, POR FAVOR?!?!?
- Tá, tá bom! Olha prá trás!
Ela virou a cabeça rápido o suficiente para quebrar o pescoço, mas, felizmente, isso não aconteceu! E viu!
Era um moço num outro balcão, tomando uma taça de vinho. A primeira coisa que Bianca notou nele era que destoava do look geral: a camisa até era preta, social, mas de mangas curtas. Não usava nenhum adorno. A calça era social, bege. Usava um par de sapatênis marrons, nada muito sofisticado. Os cabelos eram pretos (pareciam naturais) e curtos.
A segunda coisa que ela notou foi que ele era SIM-PLES-MEN-TE LINDO! E tinha um jeito livre, descolado, muito charmoso!
A terceira.... bem, ele estava olhando diretamente prá ela!
Com a mesma rapidez com que virara prá olhar prá ele, ela se voltou prá Bárbara:
- Ai, Bá, o que eu... Bá??? BÁ?!?!?!?
Mas Bárbara e Adriana já estavam em outro canto do bar, dando tchauzinho prá ela...
Bianca engoliu em seco! O coração se acelerou!
E o moço bonito ouviu! Ou o que mais significaria o sorriso que se formou em seu rosto?
Os olhares se cruzaram, de novo. E, desta vez, ela não conseguiu se desvencilhar.
Ai, meu Deus, que lindo, que lindo, que lindo!...
Ele deixou a cabeça pender para um lado e aumentou o sorriso, num gesto quase infantil.
Ai, que fofo!!
Mantendo o sorriso, ele fechou os olhos. Mais um gesto infantil que deixou sua “interlocutora” nas nuvens, com os olhos brilhando muito!
Ele sentiu isso.
Empertigou-se, terminou a taça de vinho em um gole só, pousou-a no balcão e se dirigiu para Bianca!
Para a encantada, enfeitiçada, cativada garota! Absolutamente nas mãos daquele estranho tão lindo, tão atratente...
Que, é bom dizer, também não havia escapado ileso! Também gamou nela, de imediato! O jeitinho doce e a beleza o haviam conquistado! Ele a queria, e muito!
Belíssima donzela! Mal te conheço e como anseio por ti!...
Face a face, as palavras demoraram um pouco para sair! O sorriso e o olhar de Bianca eram de uma beleza, de um brilho indescritíveis! Ela era toda um brilho! Era dele! Estava apaixonada, estava perdidamente à mercê daquele moço com quem não havia trocado sequer uma palavra!
Ele pegou a mão dela. Bianca sentiu uma energia incrível, algo tão intenso que a fez ficar boquiaberta, estática! E, quando ele beijou a mão, ela fechou os olhos, em êxtase!
Consciente do efeito que havia causado, ele esperou. Ela, respirando ofegante, piscou, antes de abrir totalmente os olhos. Tentou falar, mas as palavras haviam fugido, ante o turbilhão de emoções! Quando percebeu o estado em que estava, a garota ficou envergonhadíssima!
Por um segundo, ele deu um sorriso do tipo “já ganhei”. Mas logo o sorriso era carinhoso. E disse:
- Que excelso prazer ser agraciado com tal beleza, com esta sublime doçura! Como se chama tão formoso anjo?
UAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAUUUU!! O QUE É ISSO?!?
- Bi-bi-bianca! – ela ofegava tanto que mal conseguia falar!
- Um lindo nome para uma linda flor! Mas o que uma anjinha faz vestida de criatura da noite?
- Ah, eu... eu... eu vim com umas amigas... e... e é a primeira vez que eu venho e... e eu sempre gostei de vampiros e... e é isso!
- Oh, sim, um tema deveras interessante! Uma fantástica maneira que a Humanidade encontrou para exteriorizar seus instintos, seus monstros internos!
- Sem dúvida! – ela começava a ficar à vontade – O ser humano sempre se projetou em lendas, né?
- Sim, de fato! Vampiros, bruxas, lobisomens,... todos facetas do mesmo complexo ser!
- Mas, puxa, você não tem jeito de alguém que se interessa por vampiros!
- Refere-se às minhas vestimentas?
- Sim, tipo,... como vou dizer?...
- Não me vesti de... “morcego”, como se diz popularmente?
- É, é isso...
- Bem, eu não penso que as roupas sejam indispensáveis para que uma pessoa seja aficcionada por Ocultismo! Ademais, eu nem sabia que viria para cá, hoje! Foi um ímpeto: estava eu passando em frente e entrei! Quem sabe a inspiração que recebi? Mas eu concordo que as roupas ajudam a fazer o clima! Aliás, você parece, ao contrário de mim, ter se preparado para esta noite!... Realmente espanta-me como as roupas de vampiro lhe caíram tão bem, Anjinha!
Isso foi suficiente para deixá-la mais feliz ainda! E meio assustada com a facilidade com que estava se rendendo ao estranho! Uma parte dela queria sair correndo dali: ele era tão TUDO DE BOM, que ela não conseguia suportar! A outra parte, pelo mesmíssimo motivo, queria ficar, ficar, ficar e ficar com ele, de preferência! Para dar um tempo a ambas as partes, Bianca perguntou:
- Ei, mas qual é o seu nome?
- Ah, o meu... bem,... – ele pareceu meio sem-graça – sou conhecido como “Machado”!
- Isso... tem a ver com Machado de Assis, de alguma forma?...
- Na verdade, sim! E por causa do português que eu uso, também! Muitos o consideram demasiado clássico! Concordo que cometo alguns arcaísmos, mas conheço o vernáculo corrente!
Bianca não resistiu e começou a rir! Foi ótimo para aliviar a tensão! Machado começou a rir, também!
- Ai, desculpa! É que... eu reparei, logo de cara...
- Calma, calma! Eu compreendo! Na verdade, achei ótimo!
- É??!
- Assim, você não fica tão tensa!...
E ele piscou! E ela quase passou de vermelha prá roxa! Respirar estava difícil!
- Mas, me diga, Anjinha, você me acompanharia num refrigerante?
- “Refrigerante”?? Aqui?!?
- Sim, eles vendem!
- Eu sei, mas... este não é lugar prá tomar refrigerante!
- Cada um toma o que quiser. Ademais, pretendo conhecê-la melhor! E prefiro que você esteja sóbria!
- Ah,... eu... bem...
- E também ousaria dizer que você não está acostumada a bebidas alcoólicas, estou correto?
Ela riu, envergonhada. Ele apenas pegou a mão dela e a conduziu.
Novamente, aquele toque inevitável, aquela energia indescritível, aquela submissão incontrolável! Sim, ela faria tudo o que ele quisesse, sim...
E ele já sabia disso!
- Anjinha?
- Sim?... – a voz dela era absolutamente lânguida.
- Você acredita em vampiros?
Nesse instante, ela piscou os olhos bem rápido, acordando! Algo lhe disse, com ênfase, que ela estava correndo perigo! Ela nunca soube de onde veio isso!
Mas soltar aquela mão, encerrar aquele contato tão gostoso?...
- Ah, eu... não sei, né? Quer dizer, quem foi que já viu um? São personagens fascinantes, mas...
- De fato! Ouvem-se histórias, com freqüência, mas provas, mesmo, não há!
- Se bem que eu não sei se a gente pode dizer que eles não existem... quer dizer, não é um grupo que ficaria se expondo, por aí, né? Eles não iriam fazer questão de aparecer na TV!... Eu acho...
- Eu penso que sim, também! Teriam que viver bem escondidos! Seguramente, seriam vistos como ameça e seriam perseguidos, caso se expusessem.
- É, pois é! Sem falar que, já pensou, se a gente amanhecesse com a cidade cheia de corpos sem sangue?
- Mas alguns relatos dão conta de que eles não sugam as suas vítimas até a morte! Não todas, pelo menos.
- É, eu já... ouvi isso, também...
- Você já recebeu um desses e-mails contando casos de pessoas que amanheceram com pouco sangue?
- Ah, já, mas... se você for acreditar em tudo que chega por e-mail, Orkut e essas coisas...
- Oh, sim, isso é...
Ele parou. Olhou-a bem nos olhos, por alguns segundos (o suficiente para derretê-la!). Depois, disse:
- Quem aqui dentro poderia ser um vampiro?
Novamente, aquela sensação de perigo! Novamente despertada por ele! E, novamente, Bianca não seguiu o instinto de sair correndo.
Mas ela conseguiu dizer uma coisa:
- Você!
- Eu?
- É, você! Você é o único que não faz questão de se parecer com vampiro...
- Bem pensado! Mas, ao mesmo tempo, não seria mais fácil, para um vampiro, vestir-se como todos e passar despercebido?
Ela olhou ao redor. Realmente, um vampiro “tradicional” seria tomado como um simples gótico! Mas um vampiro vestido de maneira usual também poderia se passar por uma pessoa comum! Os dois disfarces eram viáveis, na verdade. Mas uma outra coisa lhe ocorreu:
- A não ser que o vampiro estivesse em busca de emoção...
- E não estamos todos?
- Sim, mas um vampiro é imortal, é eterno! Ele precisa de emoções novas, de coisas diferentes!...
Ele sorriu. Um sorriso muito bonito, que a fez esquecer de qualquer preocupação...
Mas o próprio Machado fez questão de trazer a preocupação de volta:
- E se eu disser que posso te mostrar uma vampira de verdade?
- O... o... o quê?!?
- Uma vampira de verdade! Eu posso te mostrar!
- Ah, tá me zoando!... – Bianca tremia de medo!
- Não estou, não...
O terceiro aviso! Novamente, ela não conseguiu reagir!
Ele sorriu mais. Começou a conduzi-la. E não estavam indo para o bar!
Enquanto percebia que era levada para um canto mais escondido, Bianca viu seus pensamentos fugirem a qualquer controle! Estava perdida num misto de excitação e medo! Eram duas numa só, se degladiando!
Machado disse que iria apresentá-la a uma vampira! Mas algo dava certeza a Bianca, agora, de que ele era um vampiro! Não tinha nenhuma prova, mas sentia isso!
Mas o que faria a respeito? Tinha medo de morrer, sim, porém havia a curiosidade: por tudo o que já ouvira a respeito, a mordida de um vampiro proporcionava um prazer incomparável! Antes de cobrar seu preço! Só que ele havia dito que alguns se alimentavam parcialmente, sem matar suas vítimas... Ele faria isso... Ou era só prá iludi-la? E se ele quisesse sugar só um pouco, mas perdesse o controle? Valeria a pena morrer pelo prazer? Mas ela poderia sobreviver! Afinal, ele não parecia um mau sujeito! Mas era um vampiro, não era? E se não fosse, e ela só estivesse imaginando coisas? Ele poderia simplesmente estar entrando no clima... Qual das possibilidades era a verdadeira?? Era impossível concluir!
Enfim, enquanto tudo isso rolava na cabeça da menina, eles saíram do salão principal e encontraram um cômodo vazio. Os olhos de Bianca estavam arregaladíssimos, e sua respiração estava até descompassada!
- Não precisa ficar com medo, Anjinha, não precisa...
Dito isso, ele a agarrou pela cintura e a beijou com imensa vontade! Bianca se entregou a esse beijo, se liberou de toda e qualquer amarra, se esqueceu de todo e qualquer medo, se esqueceu até do seu nome! E gostou muito quando ele lhe deu uma mordida na língua, e nem se incomodou com o filete de sangue que lhe escorreu pelo canto da boca! Só sentiu algo bom, muito bom!...
Machado colocou a mão por debaixo da saia dela e acariciou-lhe a coxa. Bianca gemeu alto! Como ele conseguia ter um toque tão prazeiroso?
Assim, eles se entregaram loucamente, ele explorando cada canto do corpo dela, ela perdendo cada vez mais a consciência de si mesma, de onde estava, de quem ele era, do que estava para acontecer, até que ele sentou no chão, e ela ficou em cima dele, os seios roçando na face de seu amado, e ele a penetrou, e ela não sabia mais quem era, só sabia do que ia acontecer, e amou aquilo, e amou aquele, e a vida era aquele momento, e só aquilo, e foram se aproximando do ápice, os gemidos altos voando feito loucos, o quarto girando, girando, tudo ficando escuro, quente, intenso, até EXPLODIR!!
Bianca tombou, ou melhor, teria tombado, se Machado não a segurasse. Ela estava quase num estado de choque: os olhos semicerrados, a boca num sorriso débil. Parecia estar feliz. Ele acariciou delicadamente o rosto dela. Ela deu um gemidinho, fechando os olhos de vez.
- E agora, Anjinha, sê minha!
E, novamente, ele a penetrou! Desta vez, no pescoço!
Quando os afiados dentes lhe perfuraram a delicada pele e o membro masculino ainda dentro de si voltou a intumescer, ela saiu do transe! Mas só para ser dominada por uma nova torrente de prazer! Gemeu tão alto quanto antes, enquanto o líqüido vital era sugado de si, e abraçou com seu amante com toda a força!
Só que, desta vez, lágrimas escorreram: ela sabia o que estava acontecendo! E sabia que não teria forças para resistir! E sabia que não queria resistir! Mesmo que morresse!
E ele sugou, sugou,...
Até que o abraço enfraqueceu. A cabeça de Bianca também! A respiração da garota era quase nenhuma!
Nisso, Machado mordeu sua própria língua ao ponto de sangrar e beijou Bianca.
Ela demorou a reagir. Mas o gosto férreo e o calor do sangue despertaram seus instintos básicos! Ela correspondeu ao beijo! E uma nova e desconhecida vontade brotou dentro dela...
A vontade do sangue dele! A vontade de sangue!
E, aí, foi a sua vez de sugar!
E sugou, sugou,...
Até que ele a parou! Ela havia sugado muito! Ele havia enfraquecido...
Tombaram ambos. Ele percebeu sua vista escurecendo...
Ela, ao contrário, estava com os olhos esbugalhados! Sua respiração foi se tornando progressivamente mais difícil! O coração tentava enlouquecer, mas fraquejava! Os músculos começaram a tremer, até um ponto em que o corpo todo estrebuchava, tendo convulsões! Ela se debatia de dor! Não conseguia nem gritar!
Até que o coração brecou! Ela desesperadamente sorveu todo o ar que pôde, na última vez em que respirou! A última coisa que fez em vida!
E ficou ali, parada, quieta, morta, com os olhos ainda enormes...
Mas um formigamento tomou seu corpo! Ela sentiu que voltava! E estava adquirindo uma força imensa! Sentiu também que os caninos cresciam e se tornavam afiados! Sentiu que ouvia muito melhor, que via muito melhor,...
E, acima de tudo, sentia a Fome!
Levantou-se, cambaleante, dominada apenas pelos instintos básicos, os únicos ativos, neste momento de confusão profunda!
Viu a luz da Lua cheia, por uma janela. De um salto, projetou-se pelo vidro, antes de que Machado pudesse fazer qualquer coisa!
- Anjinha!! Não! Não vai sozinha! Volta!
Mas ela não voltou!
Preciso... não posso deixá-la sozinha, ainda...
Machado mal conseguiu se pôr em pé, graças à falta de sangue. Tudo girava, e ele teve um trabalho absurdo em apenas se vestir! Chegou a pensar em lançar-se nu à perseguição, mas isso poderia atrair mais curiosos do que já deveriam estar atraídos pela confusão que Bianca, com certeza, já estava fazendo lá fora!
Tenho... que ir... tenho que ser rápido!...
Díficil, no seu atual estado. E também havia o pânico que o tomava! Ele havia sido imprudente! Deveria ter estudado melhor Bianca, tê-la conhecido melhor, antes de transformá-la! Talvez ela não estivesse pronta para a transformação! Mas ele não tinha como deixar de transformá-la: havia se apaixonado por ela, também, e a queria ao seu lado, para sempre!...
Mas, apesar disso tudo, ele se movimentava melhor do que qualquer humano faria! E, graças a seus instintos avançados, ele conseguiu distinguir o rastro de sua amada, e ver...
Ver Bianca com a boca toda suja de sangue, olhando feito uma louca, para todos os lados, procurando uma presa! No chão, havia um cadáver de uma mulher. E não parecia ter mais ninguém ao redor!
Se pudesse, teria respirado aliviado. Afinal, ela estava alimentada, e ninguém havia presenciado a refeição, aparententemente...
- Anjinha!
Um susto! Ela se volta na direção da voz! Seu ímpeto é atacar!
Mas ela vê alguém conhecido, e é uma visão boa...
- Anjinha, sou eu, lembra?
De certa forma, sim. Mais do que isso, ela sente. Seu frenesi começa a se esvair. Seus músculos se relaxam ao ponto de ela cair de joelhos, olhando fixamente para o dono da voz.
Este, vagarosamente, se aproxima, se abaixa em frente a ela, lhe toca a face...
- Ei, garota, lembra de mim?
Ela abre a boca, mas não diz nada... Ele prossegue:
- Você é minha Anjinha, lembra?...
O toque e a voz fazem com ela feche os olhos. Ela se lembra, sim, de ambos. Ela se lembra da primeira vez em que ele a chamou de “Anjinha”...
- Ó, minha Anjinha bela, adorada...
Ela levantou os olhos. O sangue, as lágrimas do vampiro, verteram. Olhou para trás. Viu o cadáver da sua primeira vítima. O raciocínio começou a voltar:
- Eu... não sou Anjinha...
- Por que não, minha adorada?
- Anjinha... não faz isso...
Ele tomou o rosto dela com as mãos e disse, carinhosamente:
- Você está confusa! Só isso! É natural! Todos ficamos assim, no momento da mudança!
- É?... Todos nós?... Quem?...
- Você sabe!
- Você e eu?
Nesse momento, uma grande preocupação voltou a tomar o vampiro. Ela estava confusa, nem haveria de ser diferente, mas havia algo a mais...
- Anjinha... você se lembra do que aconteceu?
- Lembro...
- Conte-me...
- Eu... estava com fome... e me alimentei... nessa moça...
- E antes?
- Antes?... Não havia nada, antes...
Machado tremeu até a alma que não tinha! Ela estava confusa demais! Talvez ele realmente tivesse cometido um engano!
E agora?
- Certo... certo... Você... se lembra de mais alguma coisa?
- Lembro de você... você é meu namorado, não é?
Ele sorriu. Um pensamento egoísta do tipo "pelo menos do principal, ela lembra" passou pela mente dele.
Só que ele sentia que teria muito trabalho pela frente. Teria que trazê-la de volta à razão aos poucos. Temia não conseguir.
Pegou na mão dela:
- Vamos?
- Prá onde?...
- Bom, eu... preciso comer, também!
- Nós vamos... machucar outra moça?
- Hum... sim! Vamos!
- Por quê? Isso é muito feio!...
- Depende do ponto de vista, Anjinha! Depende exclusivamente do ponto de vista!...
Sim, de fato, ele teria muito trabalho pela frente!

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